Pyongyang adianta <br> pressupostos do diálogo
Fim das manobras militares conjuntas realizadas por EUA e Coreia do Sul e um pedido de desculpas pelas contínuas acções hostis, levantamento das injustas sanções decretadas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, e a retirada do dispositivo nuclear norte-americano da região, com garantias de que que não voltará a ser instalado, são as condições que a República Popular Democrática da Coreia (RPDC) pretende ver satisfeitas para a existência de negociações capazes de baixar o nível de tensão na Península.
Os pressupostos, avançados no final da semana passada pelo Comité de Defesa Nacional da Coreia do Norte, foram reiterados, sábado, por Pyongyang, cujas autoridades sublinham que «o diálogo e a guerra não podem coexistir», considerando, também, que a desnuclearização começará quando o Pentágono ordenar a retirada do seu arsenal e abandonar o objectivo de desarmamento unilateral da RPDC.
A República Popular da China manifestou imediatamente o seu apoio à proposta de diálogo apresentada pela Coreia do Norte e sublinhou o processo negocial como «a única e a melhor via para solucionar» a situação criada. EUA e Coreia do Sul, por seu lado, qualificaram as exigências como «totalmente inaceitáveis».
Na base dos requisitos apresentados pela RPDC estão a inaceitável chantagem nuclear dirigida não apenas aos norte-coreanos mas imposta no plano mundial ao sabor dos interesses norte-americanos, o cerco e ameaça lançados contra a Coreia do Norte, e a estratégia militar dos EUA na Ásia.
Quanto ao primeiro aspecto, está por provar que o lançamento de um foguete pela Coreia do Norte no primeiro semestre de 2012 – quando começou a actual escalada belicista e diplomática –, tenha sido, como argumenta o imperialismo, um ensaio de um míssil balístico, e não a colocação de um satélite em órbita, como afirma Pyongyang. Os dados conhecidos e a opinião de reputados especialistas (ver artigo de Gregory Elich no resistir.info) indicam exactamente o contrário.
Acrescem dois aspectos relevantes. De então para cá, Índia e Paquistão, potências nucleares que já se envolveram em três conflitos, realizaram vários testes semelhantes, esses sim, com assumidos propósitos militares. Ainda no passado dia 10 de Abril, a Lusa noticiava que o Paquistão havia lançado com sucesso um novo projéctil com capacidade nuclear. Nenhuma condenação internacional foi divulgada, como não foi alvo de polémica que, no próximo Orçamento do Estado do país com o maior número de ogivas nucleares declaradas, o presidente e Nobel da Paz, Barack Obama, proponha um aumento de sete por cento das verbas destinadas à modernização do arsenal nuclear, e uma concomitante redução de 20 por cento dos programas de não-proliferação.
Relativamente ao cerco a que a RPDC diz estar sujeita, salienta-se o recrudescimento do sentido agressivo da aliança militar estabelecida entre EUA e Coreia do Sul (anterior ao alegado ensaio nuclear realizado pela Coreia do Norte no passado mês de Fevereiro, seguida da recente venda aos sul-coreanos de bombas de última geração e helicópteros), as manobras conjuntas de Washington e Seul desde Março, que prosseguem e para as quais foram mobilizados, como nunca antes, meios com capacidade nuclear – vasos de guerra, bombardeiros, equipas de combate, etc. –, ou a deslocação de radares e mísseis para o Pacífico Ocidental e ilha de Guam, bem como a anulação pelos EUA da diminuição de iguais dispositivos no seu território, caso dos sistemas colocados no Alasca.
Em entrevista à NBC, gravada antes do atentado de Boston e difundida no início da semana passada, Obama disse não acreditar que a Coreia do Norte tenha capacidade para lançar um míssil nuclear. A razão de fundo de toda esta escalada poderá ser, neste contexto, a estratégia militar dos EUA para a Ásia visando a China, como sustenta de forma implícita a RPDC.
Recorde-se que, no ano passado, o secretário da Defesa Leon Panetta anunciou que nos próximos anos a região será o principal enfoque norte-americano. A verdade é que nos últimos dias tudo parece enquadrar-se neste propósito, já que, à boleia da crise na península coreana, o Japão (que mantém um diferendo territorial com Pequim) concentrou efectivos e meios militares na sua costa Ocidental e instalou mísseis Patriot em Tóquio, Taiwan realizou, a semana passada, as maiores manobras militares com fogo real desde 2008, as Filipinas admitiram o estacionamento de tropas do aliado norte-americano em caso de guerra com a RPDC, e Singapura acolheu um navio de guerra dos EUA projectado para o combate no litoral.